sexta-feira, 19 de abril de 2013

A verdade é que eu quis você todos os dias da minha vida. Todos os dias é uma hipérbole ilógica, porque a vida é um tabuleiro de xadrez. Preto e branco, preto e branco, preto e branco, e quando você pensa em mudar, encontra o marrom da mesa, e é xeque-mate. Peça perdida. Nada é tão monocromático quanto parece. O destino é algo que um microscópio avalaria como reunião de repetições improváveis. O destino é o que acontece todos os dias e não nos damos conta. Não damos conta de nada, a lista do fiado só aumenta. Fomos protegidos pelas propagandas bancárias, e sabe-se lá o tamanho da nossa dívida por respirar, amar e ser feliz. Imagino o respaldo de quem cobra, mas quem é que cobra o que deve pagar também? É aí que entra um buraco negro na história. Questão de fé é também questão de sanidade. E a verdade, como eu dizia, é que eu quis acreditar que você era a repetição e o marrom da madeira ao mesmo tempo. Querer você todos os dias era uma forma de perfurar a alma do relógio. Magoar o tempo e necrosar o passado. As janelas fechadas e as ruas desertas afirmam que a previsão do tempo é dor, saudade e tédio. Não necessariamente nessa ordem. Eu quis você todos os dias, mas é época de eclipse solar. Dizem nos consultórios terapêuticos imaginários, cruéis e clichês mundo afora que essa frieza é uma armadura. Eu não sei dos materiais mais rígidos do mundo, mas frieza não protege ninguém de nada. O nosso carbono que usamos no dedo feito diamante, era só grafite. Amor alotrópico. Essa frieza nunca nos protegeu e você sabe. O resto do mundo é um inverno, do que adianta essa toda hipotermia cheia de metáfora como um cadáver cheio de algodão? Não impede a morte. O resto do mundo é um inferno. Eu e você somos um resto de pólvora, uma luta armada constante. Eu lutando para acreditar que tudo isso é verdade, você quebrando todos os meus ossos, milimetricamente calculados para que eu fosse alérgico ao gesso e à cura. Que sou fogo por dentro, e isso tudo é uma brincadeira, um passatempo. Que sou um caracol e não mais que isso. Mas te levo nas costas, e moro em ti. Mas como tudo em mim é eufemismo às avessas, como tudo é um exagero e um superlativo macabro, eu erro a gramática e eu morro em ti. Um caramujo sem casca, que morreu acreditando carregar o peso do mundo e do amor nas costas, mas morreu porque não conseguia carregar absolutamente nada. E a concha perdida no mar, hoje é só silêncio.

sexta-feira, 5 de abril de 2013

Desabafo número: "Meu Deus, eu ainda estou contando?"

E de todo início, esprememos um fim. Retiramos as cascas, os pedregulhos, exploramos até a última gota que umedece a nossa língua, e morremos de sede, mas morremos poeticamente. Parece que tudo acaba quando queremos abrir a boca e dizer que superamos. Superamos a dor do fim que nós mesmos montamos, bem lá no fundo do nosso ego, onde todas as bocas estão viradas pra você, todos os olhos querem afagar você, e o seu nome vira motivo de chacota nas rodas de pessoas que você não gosta apenas pelo fato de você gostar de sorrir feito um pateta, quando não quer. E ainda diz, enche a lábia para dizer que é idiota quem pensa que você está sofrendo, que você não pode dar a volta por cima. Não pode. Porque a volta foi a meia volta que você não deu, ficou pra trás, que você passou por cima pra dizer que a vida continua. E é essa droga de vida que eu não me vejo vivendo. Esse contínuo ato de respirar, amolecer, dormir e injetar doses de cafeína na tristeza para que ela deixe nascer algo bonito pela madrugada que você deveria estar dormindo, sonhando, agradecendo ao Deus, que não é meu, metido no meio do título só para dar ênfase como um marca-texto de cor duvidosa... (Eu me perdi, onde estávamos? Não estávamos.) Agradecendo ao Todo-Poderoso por mais essa chance de recomeçar. E olha lá a palavra de novo. E eu fico aqui, no meio das letras, esticando o meu começo e procurando um fim. A gente sempre procura um fim pra poder recomeçar, essa é a verdade. Um desses fins de novela que a gente aluga na locadora e assiste três vezes por semana só para dizer: Ah que bonito! Que bonito os pássaros cantando, o beijo apaixonado dado no meio do lábio e encostando pelas bandas frias do queixo, aquelas lágrimas, que bonito gente babaca com maquiagem babaca e falas babacas se ferrando no final. E a gente volta, vê. Se emociona com o tempo passando, decora as rugas, decora o roteiro, e pode jurar que já viu esse filme antes. Eu que já vi esse filme antes, centenas e centenas de vezes. A gente gosta mesmo é de ver a felicidade passada, emoldurada, como um troféu de conquista vitalícia. E seguramos as pontas, por tudo o que é mais sagrado nesse mundo, seguramos as pontas e dizemos que a próxima competição já está completamente ganha. E se o destino não colaborar (quando erramos, a culpa é do destino. Mas se ganhamos, o mérito é nosso por termos dado a tal da volta por cima), se o destino não colaborar, se o destino se fizer de doente, foi uma fatalidade, e daremos sim, a volta por cima. Já passou, agora é hora de focar na próxima batalha. E nessa batalha ridícula de catar os cacos de uma alma pesada, eu não vejo a hora de erguer bandeira branca e me deitar no chão úmido e no lar quente dos covardes para um sono eterno, profundo, onde só há um fim, mas nenhuma porcaria de recomeço.

quarta-feira, 3 de abril de 2013

Amanhã, eu juro.

Viajar. Viajar para Roma, Itália, provar do chocolate suíço, ir às lágrimas com teatros mundo afora, imaginar os Jardins Suspensos da Babilônia. Comer do bom e do melhor, vender uma parte da vida, colocar a bolsa nas costas e sair, comemorar, conhecer novas pessoas, de almas tão desconhecidas. Viver romances em Paris, jogar moedas em poços mesquinhos, comer pizzas caras, desejar que o eterno seja mesmo tempo demais. Beijar na chuva, beijar debaixo d’água, beijar só por beijar, mas beijar só por beijar porque não pensou, pela primeira vez não pensou que se arrependeria depois. E amar. Verdadeiramente, amar e ganhar baldes d’água imaginários na cabeça quando, em público, gritar em silêncio que ama, só por amar. Ama sem dinheiro, sem compromisso, sem foto pra provar. Quem sabe aprender um novo idioma, uma língua morta, ganhar o prêmio Nobel e escrever um livro de memórias. Mas que nessas memórias estejam contidas as coisas que não foram contidas. Comprar um barco, um camelo, pedir desculpas, e pedir desculpas aos filhos, quando estes estiverem cansados e enrugados demais para ouvir você dizer que eles são o maior sonho já realizado. E depois disso tudo, uma biblioteca com seus livros preferidos, conhecimento de toda a obra daquele tal artista que quase ninguém conhece, um cachorro tirado de rua, um abraço num desconhecido, elogios do pessoal do trabalho voluntário. Chorar em público, passar um trote, queimar dinheiro, pular de uma cachoeira, viajar com os amigos, aprender a nadar, virar astronauta, dançar como um louco no meio de uma festa chata, subornar alguém, ser DJ por um dia, entrar em coma alcoólico, tatuar uma idiotice… Fazer besteira. Ou então, mais ainda, fazer besteira em Las Vegas, com o amor da sua vida. Passar 72h acordado, escalar uma montanha, pular de paraquedas, arriscar um bungee jump… Tudo o que for radical, até mesmo uma mudança radical no cabelo, no visual, uma mudança radical de vida. Gritar em praça pública, gritar o mais alto que puder, gritar como se já não escutasse a própria voz há muito tempo. Como se já não aguentasse mais. Xingar o chefe, se demitir, fugir de casa, comprar o chocolate mais caro e mais gostoso, experimentar comidas exóticas, nadar com tubarões. Quem nunca quis nadar com tubarões… Só quem preferiu comprar um pônei. Dormir ao relento e rezar para não morrer. Para não morrer. Rezar para não morrer. E quando chegar o fim do ano, com aquela roupa branca suja de champanhe, dizer com todas as letras que aquele sim, aquele foi o ano mais incrível da sua vida. Riscar a felicidade do caderno de metas. E sorrir, contente, para a lápide quente. Essas coisas que a gente quer, que a gente ama, que a gente sonha, antes de ir para a cama e lembrar que o mundo não acabou, que já passou da meia noite, e que já não aguentamos mais essa sequência de amanhãs. Mas ainda é cedo… E amanhã, amanhã eu juro, eu juro que penso nisso.