domingo, 28 de dezembro de 2014

Quantas vezes eu desejei alguém com braços suficientemente grandes pra me segurar com força e dizer que a gente pode ser amado por cada pedacinho vivo nesse planeta. A gente pode ser amado pelas formigas que evitamos pisar quando somos crianças e nosso sentimento de empatia é maior que a nossa despreocupação, podemos ser amados pelos cachorros que fazemos carinho ou alimentamos, podemos ser amados, inclusive, pelos refrões acústicos das músicas que mais repetimos, mas não é bem assim que acontece, certo? Minha mãe, que deveria ter os maiores braços do mundo, mas não tinha, disse uma vez que estava tudo bem. Que eu ia despertar o amor de alguém mais cedo ou mais tarde, que eu era uma boa pessoa, interessante, bonita, que eu ia me casar e ser extremamente feliz com a pessoa que escolhi pra mim, com vários filhos que herdariam a minha cara e um bom emprego, porque sempre fui um rapaz inteligente e esforçado. Mamãe dizia que meu sorriso era lindo e que eu deveria mostrá-lo mais. Mas não é bem assim que acontece. O tempo fez com que eu me aproximasse de mais pessoas e fez com que eu sobrevivesse até o ano de 2014, era da selfie e da ostentação da felicidade. Eu deveria ter aproveitado mais daquele jovem rapaz gorducho e de nariz redondo que, de tanto fazer força pra manter os lábios cerrados com medo de dizer alguma bobagem, acabou com o sorriso meio torto. Eu não me importava tanto com as coisas ao meu redor. Eu não entendia todas aquelas piadas e tanta desaprovação se pizza era uma coisa tão gostosa, se ficar calado o tempo inteiro era uma coisa que deixava todo mundo tão calmo. Não podia ser uma coisa ruim, que levasse junto tanta dor. mas hoje, eu entendo.
Entendo que quando as pessoas saem pras festas e me levam junto, elas querem que eu me divirta embebido pelo álcool. No fundo, elas querem que eu seja diferente. Ainda querem. Elas querem sempre que eu seja um pouco mais diferente e distante de ser eu. Todas as pessoas que me amam: elas amam a minha mudança. amam a parte de mim que não se esconde no banheiro pra chorar, que não escreve essas besteiras, que não se importa com os problemas psicológicos dos outros, que não tem medo das garotas e finge que superou só porque beijou uma garota que não lembra mais que eu existo ou foi pra cama com algumas pessoas que eu gostaria que nunca tivessem existido. Eles amam a parcela de mim que ama a mãe o tempo inteiro, não só nos momentos em que é conveniente, eles amam a parte de mim que não reclama da carência das pessoas porque é exatamente a carência que carrega nas costas a maior parcela da vida e sabe o quanto isso é desnecessário, alguém que não se ressentia toda vez que era o último a ser escolhido na educação física. E por mais amigos que eu tenha, por mais que as pessoas que mais se importam comigo estejam a apenas passos de distância de mim, eu não me sinto suficientemente protegido. Eu gostaria de diminuir ao ponto de ser apenas uma mísera hemácia do meu próprio corpo. Eu sou sempre um entrave na vida de quem quer que seja porque eu sou um entrave na minha própria vida, e quem quer que seja que se aproxime de mim, faz parte da minha vida. Eu gostaria de não escrever pra mim as coisas que eu deveria falar pra um psiquiatra que, provavelmente, me entupiria de remédios por dizer que eu sou depressivo demais pra minha idade. Eu simplesmente não me importo mais, porque amo a parcela de mim que não costumo ser.
Amo o jeito como eu faço piada de tudo que está ao meu redor, amo o fato de me reconhecer em bandas que ninguém conhece, amo quando consigo ser irônico, sarcástico, cruel e ter uma legião de fãs por causa disso. Gosto quando esnobo o amor dos outros porque vejo a felicidade alheia como num daqueles espelhos de circo: completamente distorcida e engraçada.
(é engraçado como duas pessoas que definitivamente não se cruzaram na maternidade, se percebem e se reconhecem em meio à fúria de sabe-se lá o que. É também hilário como eu não consigo entender a complexidade de um envolvimento dessas proporções pequenas. É super divertido como eu não tenho ninguém pra ligar no fim do dia e acho um porre quando as pessoas ligam pras outras no fim do dia porque eu não me importo com o dia de ninguém além do meu, que é uma porcaria na grande maioria das vezes. Espera... é engraçado?)
Enfim. Estou alheio a todo mundo quase sempre. Não me aborrece na maior parte do tempo porque está sempre tudo bem. Está sempre tudo ok comigo, eu tenho internet rápida, tenho livros legais, tenho um filósofo pessimista preferido pra idolatrar, um autor bêbado na estante que me faz ter inveja por não conseguir fazer com um papel em branco o que ele conseguia fazer com o próprio coração (salve, buk), está tudo bem comigo, mas não está nada bem dentro de mim. Nunca está, nunca esteve.
Mas vai ficar, quando eu encontrar alguém com braços grandes o suficiente que me diga o que eu mais quero ouvir na minha vida:
jovenzinho, você já cresceu. Emagreceu, ficou mais bonito, realmente, mesmo que não se sinta assim, quebrou a cara, fez novas amizades, quebrou a cara novamente, fez novas amizades novamente. e, adivinhe? Elas também vão te machucar, mas elas te amam. Elas amam a parte de você que você conhece mais do que o resto de si, então não se preocupe. quando você se sentir triste, jovenzinho, pergunte à essas pessoas qual a sua melhor face. Ou então, faça uma piada. Tudo se resolve com uma boa e ácida piada. Sim, jovenzinho, você cresceu, mas não é mais certo que você construa uma linda e fantástica família feliz, porque nem você sabe o que é isso. Não é mais certo que você vá se casar, porque ninguém é obrigado a lidar com você o resto da vida, e você sabe que não aguentaria um divórcio sem se tornar um alcoólico nojento. Você é realmente uma boa pessoa, mas isso não importa pra ninguém além dos mendigos que você ofereceu esmola. Até porque, a inveja e o desprezo que você sente de todo mundo que consegue ser mais interessante e simpático que você não é uma coisa muito agradável de ver daqui, partindo do ponto de vista da sua consciência. Seu bonito e selvagem cabelo irá cair algum dia e você parecerá menos interessante do que já é, mas está tudo bem. No futuro, a internet será ainda mais rápida. você desenvolverá um transtorno do pânico na meia idade e ficará em casa apodrecendo seus olhos e seus ouvidos com o silêncio e a tristeza do apartamento minúsculo e mal cuidado, mas ninguém vai se importar. Eu sei o quanto você gosta de ficar em casa, jovenzinho, e eu sei o quanto te incomoda ver que as pessoas se incomodam com você. As pessoas que você ama mais do que a sua própria família, e sabe que isso é um erro, porque você é egoísta e nunca consegue aprender com os próprios erros, mas está tudo bem. Eu sei que seus amigos são tudo pra você. Sei o quanto te incomoda que eles te chamem de chato, insuportável, gordo (você gosta mais de comida do que de gente, assumamos), antipático e estraga-festas, mesmo quando você só quer um abraço, mesmo quando você quer sumir do planeta, ou quando você quer que o planeta inteiro te abrace, como alguma coisa imensa e sem calor que te acolhesse maternalmente. Não pense que é por maldade sua, jovenzinho, mas eu sei que você cresceu ouvindo quem você era, como um CD arranhado. As pessoas não mudaram o disco porque você não mudou e isso te assusta, jovenzinho solitário e gorducho do nariz redondo. Eu sei que você ainda é o último a ser escolhido e isso faz você experimentar o gosto da autopiedade. Eu sei e você sabe mais do que ninguém que essas pessoas vão te tratar apenas como o amigo que pode ficar sem beber e dar caronas. Ah, qual é, jovenzinho? Você não é o amigo mais divertido e animado desse mundo, nós sabemos. Não venha dizer que eu, criatura dos braços enormes, te decepcionei. Nós sabemos também que você vai ficar contente com qualquer coisa que eles façam por você, mas nunca será o suficiente. Você vai sentir falta das mensagens de aniversário e de feliz natal das pessoas que já esqueceram da sua existência, e você sabe que seus relacionamentos daqui pra frente serão sempre superficiais e imaturos, o que vai rolar é no máximo um sexo selvagem e depois você dá o número errado esperando que ela digite o número certo. Não acredite tanto no que a sua voz interior diz, jovenzinho. É impossível ser feliz sozinho, mas é impossível amar sozinho também. É?

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