terça-feira, 7 de maio de 2013

O inferno não tem cheiro de enxofre. O céu já me mostrou demônios. Perdões e pecados, juntos, como espírito e carne, caminhando lado a lado na trilha do meu purgatório onde os gritos de tormenta são teus sussurros que me gritam incertezas e talvez. O paraíso como ilha deserta, tranquila, sem coral e sem perdição. O avesso é o lado de cá, inflamável e masoquista. A paz também enlouquece os solitários, mesmo aqueles que já venceram a guerra das bocas e erguem a bandeira branca manchada de sangue e vitória como papel e lápis. A companhia das letras é veneno bom para tomar aos poucos. Aos bocados, ela seca e desentope as artérias do que deve explodir dentro da gente. Não sei e nem quero ir para o céu todos os dias, porque sou feito de metades. A linha que separa os meus desejos é o medo que se alimenta das pedras de todas as fortalezas que construí na vida. Medo que me impede de ser salvo e morar na ilha, medo que impede que tais paredes me isolem das tragédias e do inferno que preciso para sobreviver. O sofrimento que respiro é o oxigênio filtrado. Sem ele a poeira invadiria meus pensamentos e a pureza do meu pulmão ilhado seria expelida como um espirro. É esse inferno que eu preciso. Esse olho vazado, esses pés rachados, esse coração crescido. O lixo, a doença, a operação tão arriscada que nenhum cirurgião conseguiria realizar, esse tumor que inflama no meu cérebro ferido. Os ossos espalhados pelo chão, a dor, a alma despejada aos pedaços como corpo leproso, as vísceras virando comida de abutres cegos, os apedrejamentos em praça pública, os rios de melancolia que escorrem mal cheirosos pelos córregos e esgotos a céu aberto são apenas os meus dias ruins. Meus dramas e meu inferno. Ai do Demônio se eu não tivesse sede de ser feliz. Ai dos anjos se eu fosse o Deus do meu corpo. Ai do mundo se eu não tivesse medo, ai de mim se a vida não me perdoasse. Eu só não me arrependo de morar no purgatório porque o teu maldito amor também tem mania de ficar em cima do muro.

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