terça-feira, 7 de maio de 2013

O uísque amargo na boca ainda não é tão sujo quanto o teu sangue fétido. Líquido preto jorra dos teus olhos, desmanchando íris molhadas pelo negro que resseca a noite, coagulando algo parecido com a alma de um porco, encharcando-me de algo parecido com sentimento, mas que fede como um cadáver. Eu morri há milhas de distância do funeral que teu amor me ofereceu, porque terra por terra e morte por amor, eu morro em qualquer canto e amo qualquer um. Despejo silêncios em qualquer ouvido surdo, para que a minha dor faça diferença em quem nunca sofreu com os sons da solidão aguda, mas a rouquidão da tua voz ainda me trava os dentes e nada faço a não ser forçar uma felicidade de mímicas. Porém, enrolando a língua e contorcendo meu corpo imune à vermes, eu sei que já não posso com o peso da minha mentira, e a mosca passeando no fundo da garrafa, buscando fuga e abrigo nos restos da minha própria vida que engoli a contragosto, avisa-me que a paixão pelo mundo dos bêbados não bastou. Apaga a luz e acende as trevas, porque o branco da parede me enlouquece. Testa o corte da face em mim, que sou quase pedra, que sou quase pão e manteiga. Desaparece com meu corpo e eu nunca deixarei vestígios, pois há tempos o vento despiu-me a carne, que de tão leve sobrou o nada, mas leva-me desse mundo onde o fruto que me alimenta é teu corpo que me abandona, e a água que da tua boca já bebi me embriaga como um vinho barato. Não temas o custo, pois não cobram para empilhar ossos de farinha. Leva-me embora, leva-me para o funeral onde tu choras lágrimas de arrependimento por mim, lágrimas de dor pelo amor que nunca me dera e hoje te sufocas como uma corda de nó frouxo, esverdeando-te aos poucos. Quanto dos teus pecados ainda murmuram e lamentam a ida de um sofrido solitário? Meu tempo de protesto já passou, e aqueço-me com madeira do caixão roída pelos cupins que sabem que meu corpo não precisa de barreira para a terra que irá comer minhas entranhas, pois no primeiro gole do meu coração que só soube te amar, a própria morte se envenenará.

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